Emanuella.
Para ela, a mais amiga, num dia seu.
A culpa foi do Cefet. Foi daquele ano de 2001, quando ela apareceu em minha vida. Apareceu como a moça que sentava nas primeiras cadeiras da sala e que fazia as horas de intervalo passarem rápido demais. Uma afinidade desencontrada, com ela confessando me achar séria demais para suas piadas. E isso passou, tão logo. Nem lembro quando minhas ligações pra ouvi-la me fazer sorrir, passaram a ser chamadas de uma Jaya em prantos, buscando serenidade. Uma base infinitamente alicerçada, eu sabia ter encontrado. Manu é minha mais amiga, de um mundo inteiro que passou. E isso foi se firmando de leve. Com primeiras fotografias em um terminal de ônibus. Ônibus que a gente fazia questão de perder, pra não deixar a conversa ir embora logo. Ela conheceu meu lado mais tagarela e não achou tão ruim assim. Presumo. Presumo talvez porque ela nunca tenha ido embora. Talvez porque conheceu meus instantes mais insuportáveis e resolveu confrontar com aquele jeito de baixinha briguenta, mergulhada numa maturidade espetacular. Manu é das pessoas que mais me trazem orgulho na vida. Dona dos meus sorrisos mais sinceros, mais escandalosos e mais irônicos. Porque a gente já ultrapassou o ponto daquela história onde um olhar falava pra caramba. Com a gente, o corpo inteiro já falava, só de saber-se debaixo do mesmo céu, da mesma cidade. Manu é a responsável por fazer um show de Zé Ramalho ser inesquecível, mesmo com minha enxaqueca em nível elevado e uma prova no dia seguinte. E um tal de Jaya presta atenção como ele é magrela e tem um nariz louco, abismada em como aquela voz vinha dali, de dentro daquele corpo. E vinha, e foi nossa. Manu é assim, a única que podia abrir meu armário de CD’s e levá-los [quase] todos embora, de uma vez, sem data prevista para entrega. A única capaz de me tirar de casa, me jogar num ônibus, e me fazer viajar pelo interior desabitado de um estado insanamente belo. De me fazer perder os cabelos por me encontrar num local deserto, após algumas horas, e ficar hospedada numa pousada estranha. Noite em claro, de pernas pra cima, sem sair do quarto, reconhecendo nossas vidas de maneira tão clara como nunca se fez. Um marco, eu diria. E digo. Porque lembro da noite seguinte, ela com uma lata de cerveja e ouvindo-cantando-dançando o tom mais inusitado de My Humps. Sem nem ligar pra minha cara de alguémmesalvedaquiemelevepracasa,agora! Manu é louca. Talvez por entrar na minha vida pra sempre. Por me fazer pedir pizza na praça movimentada, junto com Cora e Éden. E o entregador achar normal nossa bizarrice e cara de sem vergonha. Mesma praça cena de um piquenique. Mesma praça de conversas na grama, com coca-cola mil litros. Com eu e Chafic caminhando como pessoas normais que somos [hein?] enquanto ela jogava o boné de Rodrigo em cima das árvores e ele corria atrás, xingando. A pista de kart como lugar de encontros marcados. As chuvas, o violão, o clã, os Clowns de Shakespeare. Manu, sempre minha. Porque ninguém mais sorriu da minha cara quando eu disse que gostava do cara mais insensível de todos e depois se desesperou na tentativa de trazê-lo pra mim, quando eu já não queria lutar. Porque pedalar uma tarde inteira pela cidade virou história, com uma parada estratégica para hambúrgueres, batatas fritas e milk shakes antes de voltar pra casa. Umas conversas desesperadas sobre nosso fanatismo inexplicável por Harry Potter, e as sessões de todos os cinco filmes anteriores de uma vez só, lá em casa, pra ir assistir ao sexto no cinema e chegar à conclusão de que os meninos estão virando homenzinhos, Manu! E depois explodir com um cachorro-quente na boca, ao ouvir uma declaração de eu pegava o Snape, ó! Ah, os cachorro-quentes desperdiçados por ela, após os cinemas! Moço, o meu é sem salsicha, sem carne, sem verdura e... Sem o que mais, Jaya?! E findar sorrindo do meu rabo de olho. Porque eu amava xingar o desperdício dela. E a cara de bobo do atendente que nunca entendia nada. Manu é a melhor companheira de filmes. Talvez porque não estranhe conversas tresloucadas sobre Almodóvar, ou inclusive goste, exaustivamente. Talvez por chegar lá em casa, numas noites de sexta-feira, com uma pilha de filmes, dizendo esse é gay, esse é bestinha, esse parece ser engraçado - pela capa, e esse eu trouxe pra você, porque é com teu marido. Ninguém mais, pra dizer que Johnny Depp é meu marido, assim, sem pestanejar. Ou pra chegar buzinando no meio da rua e me mandar botar uma roupa, que eu tô ótima e a gente tem que sair pra uma conversa séria. E eu voltar pra casa com dor no maxilar, de tanto sorrir e comer. E eu sempre ia, porque às vezes era sério mesmo, e os problemas dela eram meus. Sempre. E os meus, dela. Isso é uma constante, em nós. Manu sabe de mim como ninguém mais. E eu sei dela, também. E por isso eu me deixei tomar uma caipirinha, misturada com pizza de atum, e ela chamando os garçons da pizzaria de Grinch, em voz alta. E ambas tontas, ao final, fugindo de um casal inconveniente e enchendo a cara de sorvete. E a certeza de que nossos melhores porres foram com coca-cola e que a Jaya ficou muito chata depois que decidiu ser saudável e não bebe mais da nossa droga. Só ela tem moral pra chegar lá em casa fazendo barulho, mandando abrir a garagem dos fundos, guardando seu teletransporte, sendo xodó de Rebeca, quebrando o pau com Éden, conversando música com Sofia e tendo moral pra chamar Clara de Clóvis. E depois, ouvir minha mãe reclamar de todo mundo junto. Só ela. Só. A moça que liga dizendo Jaya, os caras da tua vida estão aqui na UFRR, hoje. Um grupo de hippies, era. E sim, eu adoro. Manu foi quem me fez provar uma cachaça mineira pura e soltar fogo pela boca. Depois passar a noite conversando nada com nada, com uma capacidade única de deixar tudo se impregnar de sentido, nessa hora. E eu nunca disse que amo. Nunca, porque sou uma besta de coração de pedra (de açúcar) que não sabe demonstrar sentimentos. Ou talvez porque as atitudes saibam valer mais. Talvez porque seja mais que amor. Talvez, porque ela seja a única que já me ouviu cantar e tocar Por onde andei, ao violão, com dedicatória. A única que merece torpedos monstros madrugada adentro. Talvez, porque ela tenha cuidado de mim quando fiquei com dengue, até altas horas da noite. E depois foi me visitar no hospital. Não sei. Manu me cobre de uma segurança tamanha, que dar em cima de Zeca Baleiro, ano passado, soava como algo banal. E pular, gritar, mandar beijo, dançar, e etecéteras, era sonho naquele show, com ela do lado. Ela que vinha comigo pra onde eu fosse, e ia bem, porque ia comigo. Ainda que não fosse falado o caminho, que ela me chamasse de Gandalf e contasse que a comitiva fracassou - quando não dava em nada. Manu e Eu. Ainda não fizeram igual. Não farão. E quando eu vim embora, uma semana antes, todos os dias foram nossos. Uma despedida silenciosa, que ia doendo de leve, mas a gente ainda nem percebia. Que findou numa última sessão Jack Nickolson. Algo como um dia de São João, com Éden correndo enquanto suas calças caiam pelas pernas, no meio de todo mundo. E caipirinha. E eu descalça no meio do asfalto, dançando com uma possibilidade de amar. Daí fico aqui, lembrando bobeiras, com uma enxaqueca infeliz e não cabendo em mim de saudades. Porque eu decidi que ia embora. Vim. Ela ficou, fazendo com que eu não viesse inteira. Não vim. Tô lá, ainda. E a certeza aumenta a cada torpedo dela contando de um show de Serginho, de uma música de Neuber, de algo que nos faça encontrar em distâncias. É um grito desesperado meu e um afago dizendo se nada der certo, te espero, e a gente vira hippie, vai ser mara! Mas vai dar certo pra nós, baiana. O resultado é qualquer coisa como meus olhos enchendo de lágrimas, ao ouvir Nando cantando Por onde andei. E a promessa de um show, juntas. Ou então essa coisa errada, assim, de não ter ninguém me chamando de baiana, aqui na Bahia. Pelas poçõezinhas, pela pronúncia exata que eu [e só eu] tenho do nome dela, pelo jeito dela de misturar espanhol e português, pelas histórias dos seus alunos pequenos, pelas falas de Ó, paí, ó!, por Neuzeleno, pela calçada da rua de trás. Por Roraima [e amizade] ser sinônimo dela, de certa forma. Tudo isso resulta num texto incoerente. Porque quando é pra valer e quer sair despencando do coração, não dá pra ser só bonito. É saudade, misturada com vontade de gravar em letras tudo o que já foi, da gente. Então, pra finalizar, poeticamente falando:
- Manu, você não vale nada, mas eu gosto de você!
20 comentários
me lembrou uma das musicas de Leoni:
ResponderExcluir"Nessas horas dorme longe a lembrança
De ser feliz...
O que vai ficar na fotografia
São os laços invisíveis que havia
As cores, figuras, motivos
O sol passando sobre os amigos
Histórias, bebidas, sorrisos
E afeto em frente ao mar."...
Tá vendo, Manu?
ResponderExcluirA Jaya curte você;
~
E o funeral daquela moça?
:*
Não que precise, mas passei para carimbar "APROVADO". Parabéns, Jaya. Fico impressionado...
ResponderExcluircaara.
ResponderExcluirque texto mais fofooo
jayaaaa..vc's duas tão lindaas =]
aff nem sei o q dizer..
flores.
que vida não?
ResponderExcluirJaya-moça parabéns.
não pelo texto, mas pelo que as palavras representam. Fiquei abobado como tens sorte.. de ser e ter.
e como de costume, encantado vou.
beijo :*
todo amor é possível. não tenho dúvidas. sei lá do que reclamo, no fundo fico assim incoerente.
ResponderExcluiro que falta.. em mim, em nós, sobra.
resta isso, imaginar romances com pessoas distantes, criar personagens felizes, de final certo..
me dedicas o que peço.. depois chega o doido batendo sua porta te culpando das coisas não vai saber porque.. hehe, não é assim.. mas poderia ser.
:*
Eita dona mocinha... chorei... rs
ResponderExcluirme fez voltar no tempo e pensar que tive a sorte de um amor assim...
Como é bom ter uma amiga que não importa a distancia, mas vai conosco para onde quer que for... dentro do coração.. sempre...
Beijo e mais beijos
Simplesmente delicioso e delicado. Como você. E que sorte terem uma à outra! Vida longa e feliz a vocês!
ResponderExcluirBeijo!!!
"Já entrei contigo em comunicação tão forte que deixei de existir sendo. Você tornou-se um eu. É tão difícil falar e dizer coisas que não podem ser ditas. É tão silencioso. Como traduzir o silêncio do encontro real de nós dois?"
ResponderExcluirHoje foi Clarice quem falou por mim, ou melhor: quem calou por mim.
Lembra daquele livro dela que te indiquei? Pois é, esse trecho é dele.
Pergunta: Qual é a unidade de medida dos saudosos?
Tempo...
Resposta: AIPM (Abraços Imaginários Por Minuto).
xD
Queria ser engraçado... Não consegui, né?
Li tudo, sim senhora! E já te falei que adoreeeeeeeei o último verso, poeticamente finalizado. kkkkk
ResponderExcluirEu acho que essa dupla tem história pra contar pra várias gerações e que ainda terão muuuuitas histórias pra contar. O que é a distância pra um amor assim, Jayazinha? Distância num é nada! E viva a internet!! rs.
O que eu acho mais gostoso disso tudo é o lembrar. Tento não mirar a saudade que dói no peito, que aperta. E coloco foco nos acontecimentos. Nos momentos únicos que passamos ao lado de pessoas que a gente ama. Pessoas que a gente escolheu pra ser da gente a vida inteira. Gostoso é lembrar, e ter a certeza que muuito mais história vem por ai.
;)
Beeeeeeejo!
como não pode ser bonito?
ResponderExcluirhaha! pode ser lindo, então?
porque foi! e muito!
eu valorizo demais minhas amizades. e sinto demais a falta delas.
que lindo vocês duas...
isso vai ficar marcado pra sempre, Jaya!
obrigada pelos elogios, mais uma vez! você é boazinha demais... rs
beijão!!
êita que amizade de alma é coisa que não se encontra, por ela somos achados.
ResponderExcluirÉ a gente no outro, um outro, ainda que estranho, dentro de nós.
lindo texto, incoerente, despencado, e, por isso, lindo.
Saudade [2]
ResponderExcluir:*
Já tive uma Manú assim na minha vida, com essa licença poética pra fazer chover e ensolarar em mim.Meu amigo ficou em outro país, mas, basta uma ligação e lá estamos nós falando asneiras, dividindo rockn'roll, poesia,insanidades,literatura e outros venenos. Amigos tem esse poder de nos fazer ter coragem de sermos nós mesmos, né? Não sei quem é a Manu,mas, já tô apaixonado por ela através de vc. Queria uma amiga dessas pra mim(tirando a parte do Depp e do Baleiro,que é daqui da minha província e já dividiu o mesmo guitarrista comigo). Em tudo, até nas coisas do dia-a-dia, aparece o seu talento narrativo. Imagino que a Manú deva estar emocionada com sua declaração de amor.
ResponderExcluirUm brinde aos amigos verdadeiros!"soulmates never die", já dizia o Molko.
Bjo baby
você não vale nada mas eu gosto de você, tudo que eu queria era saber pq, tudo o que eu queria era saber pq?!
ResponderExcluirkkkk
beijos, flor
MM.
>>>> sem paragrafo, flor? afffffff
é bom ser o sorriso de alguém! e é bom ter o sorriso dos outros na gente.
ResponderExcluirNunca respondeu meu e-mail....e ainda vem com papinho de saudades.
ResponderExcluirHumpf.
Eu sinto saudades.
ResponderExcluir[Mas sou enrolada].
Caraaa,
ResponderExcluirquase chorei com esse texto (quase, tá!?).
Bateu uma saudades!
Era tão bom sair pra comer pizza no meio da madrugada. Melhor ainda, era ver Emanuella reclamando do atendimento e chamando os gançons de Grinch.
Pegar táxi, mas só se passar cartão e parar em todas as lanchonetes da cidade.
Jaya, cê nem sabe... eu liguei pra o "X" e o homem ainda lembra de mim! Depois de um século ele ainda falou: "na casa colorida, né?"
Neozeleno! ô Neolzeleno kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
- "coooooooooorre! Lá vem o casal incoveniente."
Nunca mais ela apareceu aqui!
Saudades de tudo. Aqui tá muiiito sem sentido, sem graça!
Eu nem tenho o que fazer, daí fico no site da tam olhando preço de passagens pra o exterior. Buenos Aires!? New York? Grécia? Vamos!?
escrevi demais!
Parabéns Manuuuuu.
Saudades infinitas minha irmã
loveu
=*
Isso é que é uma bela homenagem!
ResponderExcluirBjooooo!!!!!!!!!