No primeiro mês escrevi um texto onde colocava
todos os meus pedaços em suas mãos: ninguém antes havia me segurado tão firme.
No segundo mês me pediu em namoro, ofegante, sorrindo uma ansiedade tímida e
rara: medi seu corpo em cima do meu com beijos e abraços e até hoje não
respondi. No primeiro dia do novo ano fui parar na emergência – e houve entre
nós uma conexão de tempos muito antigos. Semanas depois, quando estávamos nos
preparando para sair, ao destrancar a porta e num gesto muito simples, virou e
disse eu te amo, pela primeira vez. Respondi que eu amo você - sem nem pensar, porque minha
voz foi ímã para encontrar a sua. No primeiro carnaval fomos à Chapada Diamantina
e passamos os dias todos no quarto, vivendo de muito amor – tanto ainda mais natural
que a própria natureza. No primeiro ano juntos quis me ver sambar no Pelourinho. No segundo ano bastava eu
aparecer sozinha para reclamarem sua ausência. No terceiro ano fomos para a
quarta casa. No quarto ano eu mudei a cama de lugar.
Eu vou para o café da esquina e aguardo uma bebida
observando os quadros e pensando em todas essas lembranças. Penso em escolher
uma parede inteira para pendurá-las. Eu penso no seu sorriso que vai se
transformando em gargalhada e me dá uma vontade besta de eternizá-lo, assim.
Não nos falamos hoje e consigo escutar sua voz. Fico tão calma. Respiro tão
leve. Mais um ano vai indo embora e renovo meus votos comigo mesma, sem nenhuma
pressa. Sou feliz aqui. Existe esse homem na minha vida, responsável pelo
encontro mais profundo que já vivi com alguém e, principalmente, comigo mesma.
Fiquei três anos sem escrever porque antes precisava muito observar. Cinco anos para entender que amor não tem idade.
Quando um amor nasce é preciso muito silêncio,
serenidade e concentração. É preciso tomar um copo de cerveja olhando o mar e tentando dissipar tamanha poesia da retina, enxergando além do que nos
cobre os olhos. Quando um amor nasce é preciso fortalecer os alicerces antes de
projetar construções. Quando um amor nasce é preciso, antes de tudo, acreditar, estar e ser. É preciso entender que nada jamais será assim tão preciso. Toda a taquicardia é contração. O parto é transbordar. A vida é quando sentimos. E vivemos para sentir.
Eu quero estar aqui e ser dele. Andar de mãos
dadas, cinco anos depois. Deixar o amor sair pelos meus poros, meus lábios, meu
sexo. Eu quero continuar esquecendo, a cada dia, todas as minhas idealizações
meninas que jamais iriam acertar o quanto a realidade é doce de ser vivida.
Mesmo quando dói. Mesmo quando tem muito silêncio. Mesmo quando estamos loucos. Nós somos capazes de passar
uma tarde inteira dançando sozinhos na sala do apartamento sem desejarmos estar
em nenhum outro lugar no mundo. Ele contabiliza todas as quintas-feiras. Nunca leu nenhum dos meus livros preferidos,
mas leu o meu livro. Até hoje não terminamos a leitura um do outro, porque
somos sim muito infinitos. Damos muita importância ao que vivemos. Eu não sou
de ninguém, mas sempre que quero me entrego a ele. Nunca sou devolvida.
Seus olhos ainda me botam muito medo. Aeroportos e
rodoviárias ainda me apertam o coração. Eu queria sempre abrir todas as portas
de todos os lugares que ele chega. Preciso dele para segurar as minhas ondas
mais difíceis. Ser gente grande é virar criança quando estamos juntos. Olhar
seu rosto enquanto dorme me traz certezas desconcertantes. Nunca pensei em
padrão porque a cada dia consigo amá-lo diferente. Eu nunca precisei dele para
ser feliz, mas vivo melhor ao seu lado. Nunca escrevi uma carta de amor
para ninguém, mas com ele tenho conseguido protagonizar uma história. Eu não
quero muita coisa. Não quero quase nada. Com ele, quero mais um ano de mãos
dadas e passeios pelos caminhos que temos escolhido. No próximo ano talvez nos encontremos em um novo lugar, talvez ainda mais profundo, um dentro do outro.
Eu fico mais bonita quando ele me atravessa.
A coisa mais bem feita que construí até aqui foi esse
amor. E ainda não acabou.