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Jaya Magalhães


Amor é sorte
de encontrar.

[Corte e Costura – Achiles Neto/ Conrado Pera]


Amor é acontecer – devagarinho ou muito célere. É (des)construção. Desabrochar. É ver nascer nos olhos do outro todas as estações do ano dentro de um mesmo dia. É aquele retrato atual dos meus avós, onde olham um para o outro como se tivessem acabado de descobrir a paixão que os une ainda hoje. Amor é quando tudo parece estar no seu lugar exato e de repente o mundo joga um terremoto de emoções só para que aprendamos a encaixar outra vez, revisitando aldeias internas. Amor é abraçar os defeitos, nossos e do outro, e não tentar anulá-los por entender que tudo é sustento; mas atenuá-los, por saber a necessidade de caminhar mais leve. Amor é também tentar consertar, pelo todo, mas principalmente por nós mesmos - é nessa hora que descobrimos a importância de sermos muita coisa, daí então espanamos a poeira dos nossos mais lindos cantos para que alicercemos todos os futuros sonhos de dois.

Amor não é só bom. É um sentimento maior que absorve em si todos os demais sentimentos, até aqueles que temos vergonha de admitir. Quando amamos, procuramos sempre tratar com carinho tudo aquilo que guardamos e entregamos. Amor é lidar com o que existe além. Não existe maquiagem, conhece-se cicatrizes. Amor cura em par. Foi ao lado dele que comecei a conhecer algumas das várias versões do amor. O amor que começa a amar de manhã cedinho e faz do outro um brunch sem precisar sair da cama, porque é domingo – e domingo o amor não tem pressa de ser. O amor que irrita, como se muitas vozes misturadas falassem coisas diferentes ao mesmo tempo. O amor tão doce, que chega do mercado cheio de sacolas e tira o outro para dançar na sala levando embora aquela dor nos pés. O amor que faz sorrir porque toca, amansa, amassa. O amor que faz doer com palavras confusas ditas em instantes cinzas e um tanto frios. O amor que está, mesmo quando sente – por um tempo - vontade de ir. O amor que reclama, por serem os dois muito rabugentos. O amor apaixonado, que faz com que os lábios se beijem o dia inteiro. O amor entre lágrimas, de felicidade, de saudade, de amar, apenas. O amor com muito tesão, que deixa rastros de roupas e brilhos de suor no corpo todo, fazendo da intensidade um confete muito sensual. O amor que entende, inventa, acredita, discute, acalma. O amor azul, esse do qual sempre falei em cada poetice que já escrevi até aqui - e não sabia ser tão real e esotérico assim. E o amor que vence todos os demais – esse, que permanece. Esse que me dá uma certeza às vezes um pouco tímida de que não importa qual versão apareça no meio do caminho: se ele encostar o coração no meu, como sempre fez, tudo vai acabar ficando bem.

O amor me ensinou desde muito cedo a não acreditar em almas gêmeas - apesar de sermos muito parecidos em nossas inúmeras diferenças. O mundo é muita gente, tanta história, infinitude doce. Sempre me soou meio impossível a teoria de que, diante de tamanha imensidão, houvesse apenas uma pessoa para amar – romanticamente - a vida inteira. Sou fruto de um amor que virou outro e de onde outros vários brotaram. O amor me ensinou que amar não tem certezas e isso nunca deve ser motivo para deixarmos de. Antes de sermos nós, eu e ele, amamos. Em outros caminhos e em outras épocas, a vida teve cuidado em nos moldar através de outros olhares, outros toques, inúmeros erros e alguns acertos. O passado soube ressignificar o presente através de uma silenciosa lapidação dos nossos sentimentos para que estivessem prontos – ou pelo menos mais seguros - quando nos encontrássemos. E nos encontramos. Seus olhos, sempre tão abertos, me enxergaram. Inaugurou-se ali um jeito novo de olhar, como se uma grande festa estivesse acontecendo dentro das nossas retinas acesas. Os cílios entraram também na dança e sambaram macios, insistentes em derramar muita poesia a cada piscadela distraída.

Fui doutrinada por um amor que informou ser basilar haver atenção nas leituras em par, para que escolhamos as palavras certas a serem usadas nas próximas páginas. Amar é fácil, de graça, todo mundo pode – e deve. Mas construir uma história de amor exige uma edição especial. Revisão. Ajuste. Adaptação. A mágica não é vista pela capa: maior esmero está no conteúdo. E para ser bonito assim de ler, eu não poderia ter escolhido coautoria melhor. A publicação acontece por etapas e sei que não há estante no mundo capaz de acumular tanto excesso de tudo isso que é coberto de um fascínio enraizado de sentir.

Assimilei com muita tranquilidade que um relacionamento é corte e costura. Cada um chega com seus muitos retalhos já vividos e tudo vai sendo remontado com a bagagem do outro. Não precisa combinar ou fazer sentido. Basta encaixar. Enfeitar. Basta que haja alguma cor. Basta haver eu e ele e todo esse magnetismo. Essa vontade eterna de seguirmos em frente, juntos. Lutando. Ele, acontecendo em mim. Eu, acontecendo nele. A vida se desenrolando.

Amor acontece.

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"Em um pulso, o sol; no outro, a lua: as mãos são feitas de céu." [Kerouac, J.]

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